22/05/2013

O pior inimigo é o amigo falso

Por Danuza Leão

Já que é inevitável ter inimigos, a coisa melhor do mundo é ter um de verdade: que te odeie com lealdade e sinceridade – sem nenhum fingimento.

Ele é capaz de falar mal de você em público sem ter, em momento algum, medo de que repitam o que ele disse. E também pode te dar um tiro ou uma facada, mas sem nunca te enganar – sempre numa boa.

Não é, positivamente, do tipo que diz “vou te contar uma coisa, mas não repita, fica só entre nós”. Dele você pode esperar sempre o pior: que impeça que aquele negócio que estava planejando havia anos se realize, que diga àquela gata que está povoando seus sonhos que você é um cafajeste, que o dinheiro que você esbanja vem do tráfico de drogas – ou coisas ainda piores.

Sabendo do que ele é capaz, você pode sempre se defender - o que é mais fácil do que lidar com a hipocrisia. Como guerra é guerra, nada que ele faça de ruim poderá surpreender - essa é a vantagem de ter um inimigo leal.

Quando se encontram num restaurante, você já sabe que deve ficar alerta e se sentar de costas para a parede, como fazem os malandros. Ele é capaz de seduzir sua filha menor, de contratar alguém para roubar seus documentos e de jurar sobre a Bíblia sagrada que viu você subornando um político. Tudo faz parte, e quanto mais coisas ele fizer contra você, mais você aprende a se defender; como se aprende com um inimigo assim - ah, como se aprende.

Perigosos mesmo são os pseudo-amigos, aqueles que te tratam bem e que volta e meia fazem um comentário sobre você – maldoso e irônico, mas não tão maldoso a ponto de chocar -, afinal, é apenas uma brincadeira, será que você perdeu o humor?

E aquele que passou anos construindo a imagem do bom caráter de carteirinha pode fazer você levar a vida inteira na dúvida, sem ter coragem de encarar a verdade: que se trata apenas de um crápula. A tal da imagem ilude muita gente, que durante anos pensa que o personagem é defensor das boas causas, dos fracos e oprimidos, e sempre politicamente correto – faz parte do modelo, claro.

Incapaz de encarar uma briga de frente, ele não consegue nem ter inimigos, pois, como ser humano, não passa de uma fraude – e de um covarde. Está sempre atrás de alguma vantagem – alguma pequena vantagem – e frequentemente comete traições – pequenas traições que dificilmente poderão ser comprovadas.

E se alguém ousar acusá-lo de alguma coisa, sempre haverá alguém para defendê-lo - afinal, de uma pessoa com um passado tão correto, só um louco ousaria dizer alguma coisa. Suas maldades e falhas de caráter nunca são grandiosas, porque nada nele é grandioso. Suas maldades são pequenas, porque tudo o que ele faz é pequeno; pequeno como sua pessoa, como sua alma.

Mas, às vezes, se tem que conviver com gente assim - como fazer?

Se for seu caso, não faça nenhum tipo de concessão. Cometa um assassinato, internamente, e esqueça de que ele existe - mas esqueça mesmo. Mas atenção: é importante que ele saiba que você sabe perfeitamente quem ele é.

Fique cego quando passar por ele, e se alguém mencionar seu nome, não ouça; esqueça das mesquinharias de que é capaz um pobre ser humano.

E valorize seus inimigos, os bons. Eles estão sempre dispostos a liquidar com você, mas sempre com a maior lealdade.

Danuza Leão é cronista e escritora.

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