18/03/2012

Coisas da Vida

PAULO CAMINHA (*)
Jornalista

De longe parece iguais.Vistas assim, sem profundidade, as estórias são comuns e as situações mergulham desajeitadas aos julgamentos precipitados dos que estão de fora, só curtindo as críticas. E, de longe parecem iguais e, se a gente fala de pessoas reais ou apela para licença a que se permitem os poetas, artistas, sonhadores, criando fantasias com os retalhos de verdade de muitas passagens, aí é que a semelhança se torna maior e alguns poucos se entendiam, misturando, sem autoridade, as pequenas diferenças, importantes para aquele que viveu ou pretendeu viver os momentos que descreveu, numa mesmice injusta.Amor é amor.Aqui, ali, mais além.E assim também é a paixão, o ódio, a violência.E comum e igual uma entrega honesta ou possuem a mesma palidez as aventuras vividas com o interesse.Seja ela qual for.Algumas coisas mudam, é verdade.Mudam em pequenos detalhes mas, na sua essência, são iguais, comuns.

Outro dia mesmo estive partilhando da felicidade de um amigo e, de uma certa forma, vibrava com o sorriso com que ele sorria para o tempo, colocando as mãos atrás da nuca, fitando um ponto imaginário qualquer, imaginando um futuro que ele vem perseguindo com paciência.De repente, seu rosto ilumina-se com a chama branda de uma paixão que está adquirindo a consistência de um amor curtido na espera.Nem mesmo as flores que ele usa para falar dos sentimentos que lhe fustigam o peito por dentro o tornam diferente daquele que só tem palavras.

Muitas vezes sento-me diante de uma folha de papel e vejo as teclas à minha frente.As letrinhas são as mesmas.Tenho consciência da responsabilidade de dar-lhes melhor sentido e aí, rebusco nas minhas fotografias os retalhos de um passado que me pertenceu.Um passado que, numa circunstância qualquer, vivi-o sozinho ou na companhia agradável de uma metade que me completou.Quando as fotografias não me dizem nada, fecho os olhos e apelo para as palavras amigas e doces que me contaram alguma coisa importante, sem me importar quando e faço delas o meu tema, sem a preocupação com a lógica de uma sequência metódica, técnica, catedrática.Valho-me, é verdade às vezes, da metáfora, uma forma acanhada de encompridar o caminho, de dizer acanhado aquilo que sinto.Mesmo aquelas que significaram bem pouco valeram a pena.Transformei-as em lições das quais não me permito a distração mais significante de esquecer.Outras, no entanto, faço questão de não esquecei e aí, apelo para cada um dos muitos momentos que nos foram comuns, marcados pela alegria do encontro que chegou depois da ânsia e da expectativa de uma espera. Não se pode inventar muito sobre o comum nem se pode confundir o comum com o banal ou vulgar, seria injusto.A mesma menina de tranças que tantas vezes esteve nas linhas, nas entrelinhas e até nas minhas páginas em branco, por exemplo, continua viva aqui dentro.Faço questão de não esquecer dela.Outro dia, no meio da semana, passei por ela e no sorriso com que me disse um “ôi” depois de tanta ausência, revivi uma vida inteira, um passado que, assim, sem mais nem menos, passou-me diante dos olhos.Isto é comum, é igual, é corriqueiro, mas não é banal nem vulgar e sobre as coisas pequeninas que faço grandes não posso inventar nem abastecer em demasia os limites e horizontes da fantasia, seja para aumentar o êxtase, seja para tomar mais sofisticada a coordenação das palavras que vou arrancando das teclas, sob pena de tornar-me enfadonho ou transformar a simplicidade de uma paixão, de um retalho de amor, de uma ira repentina ou de um perdão temporário ou eterno numa novela sem fim e sem nexo.

Qualquer dia desses, só para fugir à rotina eu chamo o homemzinho verde para levar-me pelo cosmos e voltar com estórias do universo ou então faço ouvidos de mercador e, sem me importar com o cansaço alheio, continuo a dedilhar meu terço, falando das coisas da vida...

(*) Sobre o Autor - Paulo Caminha é doutor em jornalismo pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Jornalista profissional desde 1975, já trabalhou em praticamente todos os principais veículos da imprensa brasileira (jornais, revistas e redes de TV). No momento é editor deste Blog e jornalista correspondente.

2 comentários:

Luiz Casadei disse...

Parabpens!
Você merece lugar de honra em nossas letras.

Glória Maria da Silva disse...

Senhor Paulo, como vai?

Não sei se o senhor leu minha mensagem anterior, onde tive a ousadia de pedir que o senhor publicasse também suas cronicas em seu Blog.

Hoje ao entrar no Blog, gostei muito de ler as duas cronicas
publicadas, elas suavizam os assuntos, não menos importantes, que normalmente o senhor aborda e iluminam nossa alma, tornando nosso dia um pouco mais colorido...

Continue publicando-as, faz bem pra quem está lendo e com certeza faz bem para o senhor também.

Tenha um bom dia