29/06/2012

Quarto de Hotel

PAULO CAMINHA (*)
Jornalista Correspondente

Estou em São Paulo. Em São Bernardo do Campo para ser mais preciso. Terminei o trabalho para qual fui designado e, agora, estou recolhido num quarto de hotel. É um hotel confortável, um dos melhores da cidade, escolhido com a doce irresponsabilidade de quem tem a despesa custeada pela empresa.

Tomo um banho demorado, usufruindo a gostosa ducha que esguicha com força sua água sobre o meu rosto cansado. Foi um dia cansativo, compensado somente pelo prazer proporcionado pela minha décima viagem de avião.

Visitei obras, entrevistei engenheiros, recebi um calhamaço de informações técnicas e suei a camisa ao passar por reatores monstros, verificando comportas e uma infinidade de lugares, conhecidos, até então, somente por fotografias e textos de revistas especializadas. Era uma usina hidrelétrica e alvo de minha história.

Agora, porém, encerradas as reportagens do dia, estou recolhido para o devido descanso.Depois de um banho, passeio pelo quarto buscando intimidade com os móveis e objetos que farão parte do meu cenário noturno.

E não identifico nada que me prenda a atenção. Olho pela janela aberta e aprecio o movimento, lá embaixo, com desinteresse.

Uma grande massa de seres humanos desconhecidos caminha em direções diversas em busca de seus destinos. E sinto o tédio dos retirantes que deixaram seu lugar de origem em busca de uma vida melhor.Não é o meu caso, evidentemente, pois, em breve, estarei de volta à casa, após o trabalho cumprido.Mas a solidão persiste.E nem o luxo que me cerca preenche o vazio que me deprime.

Busco nos fantasmas do passado o conforto para minha angústia, mas as imagens me fogem. É como se eles, assim como os familiares e amigos vivos, tivessem ficado em minha terra distante. Covardes! Suas ausências não se justificam já que não precisam dos vivos para se locomover.

Lembro paixões doentias, mulheres maravilhosas que fizeram de minha vida este amontoado de sentimentos que me faz transcrever para o papel minhas emoções.

Mas elas também me fogem à memória, escapam como água entre os dedos e descem pelo ralo da distância, projetando-se no fosso do esquecimento.

Sozinho, sem ninguém com quem trocar palavras, cercado por pessoas estranhas, sinto-me perdido, desorientado. Saíra de Itabuna aborrecido por pequenos problemas e não via a hora de estar só com meus pensamentos.Estava fugindo, por isso aceitei com satisfação a tarefa de cumprir um trabalho fora do Estado da Bahia.

Agora, entretanto, cercado de carpetes, lustres e mobílias de luxo, estirado nos lençóis de seda desta cama macia desfilando minha nudez pelo quarto vazio de esperança, percebo a importância das pessoas que fazem parte de meu dia-a-dia, e como estava perto da felicidade que, tantas vezes, busquei nos inúmeros painéis luminosos que sempre povoaram minhas fantasias.

(*) Sobre o Autor - Paulo Caminha é Doutor em jornalismo pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo-(ECA/USP). Paulo Caminha é jornalista profissional desde 1980, já trabalhou em praticamente todos os principais veículos da imprensa brasileira (jornais, revistas e redes de TV). Atualmente, é professor universitário e jornalista correspondente do jornal americano The New York Times.

E-mail: paulo_caminha1@yahoo.com.br

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